Contexto: O advento de terapias avançadas, como as células CAR-T, oferece um potencial inovador para o tratamento de mieloma múltiplo (MM) recidivado ou refratário, especialmente em pacientes que esgotaram as terapias convencionais. No entanto, o alto custo desses tratamentos representa desafios significativos para os sistemas de saúde, especialmente em países com recursos limitados, como o Brasil. Nesse contexto, o desenvolvimento de estratégias de precificação eficazes que equilibrem benefício clínico e custo é crucial para garantir o acesso e a sustentabilidade financeira.
Objetivos: Este estudo de caso visa avaliar o uso de duas metodologias para orientar decisões de precificação baseadas em valor sobre ciltacabtagene autoleucel, uma terapia CAR-T recentemente registrada para o tratamento de MM no Brasil.
Métodos: Duas metodologias foram aplicadas para avaliar o valor e o preço do ciltacabtagene autoleucel: Análise de Fronteira de Eficiência (EFA) e Índice de Inovação Farmacêutica (PII). A EFA foi utilizada para comparar a relação custo-efetividade do CAR-T com o segundo transplante autólogo de células-tronco (TCTH), analisando dados de sobrevida global de ensaios clínicos e evidências do mundo real. A estrutura PII avaliou o grau de inovação, com foco na necessidade terapêutica não atendida, no valor terapêutico agregado, no desenho do estudo e na qualidade metodológica.
Resultados: A EFA demonstrou que o ciltacabtagene autoleucel proporciona um benefício de sobrevida de 7,27% em relação ao TCTH em um horizonte de 48 meses. Considerando os custos diretos com o segundo TCTH sob a perspectiva brasileira, a Razão Custo-Efetividade Incremental para o ciltacabtagene autoleucel foi calculada em R$ 54.219,15 por mês adicional de sobrevida. O escore PII para o ciltacabtagene autoleucel foi o mesmo do TCTH (62,5). Ambas as análises indicaram que, para que o ciltacabtagene autoleucel seja custo-efetivo no sistema de saúde brasileiro, seu preço deve ser significativamente menor do que seu preço atual no mercado internacional.
Discussão: Embora o ciltacabtagene autoleucel ofereça benefícios clínicos consideráveis, particularmente para pacientes com MM com opções limitadas de tratamento, seu alto custo representa um ônus financeiro significativo para o Sistema Único de Saúde (SUS) do Brasil. O estudo enfatiza a necessidade de novas estratégias de precificação que alinhem o custo da inovação em terapias avançadas com seu valor clínico, equilibrando o acesso com a sustentabilidade econômica. Os formuladores de políticas devem considerar tanto a eficácia clínica quanto as implicações econômicas ao incorporar esses tratamentos de alto custo à saúde pública.
Conclusão: Os resultados ressaltam a necessidade crítica de modelos de precificação baseados em valor para terapias avançadas. Para garantir amplo acesso, especialmente em um sistema de saúde universal, o preço da inovação farmacêutica deve refletir seus benefícios clínicos, mantendo-se financeiramente viável. A adoção de estratégias de precificação baseadas em evidências pode ajudar a alcançar esse equilíbrio, garantindo que tratamentos inovadores sejam acessíveis aos pacientes, ao mesmo tempo em que preserva a sustentabilidade do sistema de saúde a longo prazo.