A Doença de Gaucher é uma condição genética rara, crônica e progressiva, cujo tratamento envolve tecnologias de alto custo disponibilizadas no Sistema Único de Saúde. Embora as terapias atualmente incorporadas tenham eficácia demonstrada em ensaios clínicos, ainda são limitadas as evidências sobre sua efetividade, adesão e custo-benefício em condições reais de uso.
Este trabalho teve como objetivo avaliar, sob a perspectiva da Avaliação de Tecnologias em Saúde, o desempenho clínico e econômico das terapias utilizadas no tratamento da Doença de Gaucher no Brasil, com base em dados administrativos nacionais.
Foram conduzidos dois estudos complementares. O primeiro, uma coorte retrospectiva de base populacional, utilizou dados do Sistema de Informações Ambulatoriais, Sistema de Informações Hospitalares e Sistema de Informações sobre Mortalidade, vinculados por meio de pareamento determinístico-probabilístico. Foram incluídos pacientes com diagnóstico de Doença de Gaucher (CID-10 E75.2) que receberam imiglucerase entre 2000 e 2015. A sobrevida foi estimada por curvas de Kaplan-Meier, e os fatores associados ao risco de óbito foram avaliados por modelos de riscos proporcionais de Cox. A adesão ao tratamento foi estimada por meio da dose diária definida. O segundo estudo, de caráter econômico, aplicou a metodologia da Fronteira da Eficiência para comparar a relação entre custo e benefício terapêutico de imiglucerase, velaglucerase alfa, taliglucerase alfa e miglustate, com base em dados de distribuição pública de medicamentos entre 1999 e 2022 e em desfechos clínicos extraídos da literatura. Foram estimados os custos por unidade de desfecho (incremento de hemoglobina e plaquetas), identificadas tecnologias dominadas e calculados preços máximos compatíveis com os benefícios observados.
Os resultados mostraram taxas elevadas de sobrevida, com risco de óbito associado a fatores clínicos e sociodemográficos. Identificou-se padrão frequente de subdosagem, sugerindo necessidade de reavaliação das estratégias terapêuticas. A análise econômica revelou diferenças expressivas na eficiência relativa das terapias, indicando margem para revisão de preços. Os achados oferecem subsídios para decisões sobre incorporação, precificação e alocação de recursos em doenças raras no contexto do sistema público de saúde.